Em conversa com o jornalista Sérgio Matsuura, do portal Comunique-se, a presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) Tereza Cruvinel analisou o primeiro ano de funcionamento da empresa. Abaixo, a primeira parte da entrevista, feita no dia 25/11. A continuação será publicada ao longo desta quinta-feira.
C-se – Antes de tudo, como você analisa o primeiro ano da EBC, que comemora aniversário no próximo dia 02/12?
Tereza Cruvinel - A EBC, enquanto empresa, chega ao final do ano muitos quilômetros além do estado que ela tinha quando começou. Era uma empresa nova, não tinha orçamento, não tinha absorvido a Radiobrás. Ainda existia uma confusão institucional muito grande. A lei só foi aprovada em março, a empresa existia como fantasma. Se a lei não fosse aprovada, a EBC iria acabar. Depois disso, nós aceleramos muito o planejamento da empresa. Agora estamos fazendo mudanças na nossa estrutura organizacional para que ela fique mais adequada a sua finalidade. Então, considero que a empresa chega ao fim do ano muito melhor estruturada do que ao nascer.
C-se - Quais seriam essas mudanças organizacionais?
Tereza Cruvinel - Toda empresa tem estatutos. Os estatutos são regramentos. Então eles dizem, por exemplo, que tal coisa só pode ser resolvida de tal modo, por tal diretor. Se o diretor viaja isso fica amarrado. Isso que estamos tentando mudar. Na estrutura propriamente dita, definimos melhor o papel da diretoria geral, criamos uma diretoria jurídica e uma secretaria executiva, para ajudar na gestão.
C-se - O jornalismo sofreu alguma mudança?
Tereza Cruvinel - Não, nada muda no jornalismo.
C-se - E na TV Brasil, como foi o primeiro ano de funcionamento?
Tereza Cruvinel - Vou fazer um balanço rápido da TV Brasil. Ela também chega ao final do ano em uma situação muitíssimo melhor. No ponto de vista de programação, este ano nós lançamos Revista Brasil, Caminhos da reportagem, De lá pra cá, Três a um, Bossa Nova, Amálgama e Tal como somos. São sete programas novos, sem contar os dois telejornais, que dá um total de nove. Então nós chegamos ao fim do ano com nove programas novos e ainda podemos lançar mais alguma coisa.
C-se – Pode falar um pouco mais sobre a programação?
Tereza Cruvinel - Ainda tem muita programação da TVE na grade. Trocar 20 horas de programação não é fácil em qualquer televisão, muito menos no setor público. Para produzir em casa, nós temos dificuldades com o sucateamento dos equipamentos. E para contratar parcerias, com produtoras independentes, tem todo um procedimento burocrático. Tem regulação, licitação, essas coisas todas que tornam o processo mais complicado. Esse ano nós gostaríamos de ter feito mais, mas não foi possível porque nós estávamos nos estruturando para ter melhores condições. Para as produções próprias, estamos realizando uma grande licitação de equipamentos de produção e transmissão. E para a contratação de parcerias, estamos criando novos procedimentos jurídicos para tornar o processo de contratação mais simplificado.
C-se – Qual o valor dessas licitações?
Tereza Cruvinel - Elas devem superar R$ 100 milhões.
C-se - Vocês estão pensando em produzir programação nova em São Paulo, não é?
Tereza Cruvinel - Primeiro nós vamos chegar com a nossa programação lá. Depois, num segundo momento, vamos ter produções em São Paulo. E o primeiro produto tem que ser, claro, um telejornal local.
C-se – Tereza, muito se fala sobre a falta de cobertura da TV Brasil. Esse problema realmente existe?
Tereza Cruvinel - A TV Brasil tem apenas quatro canais abertos próprios. Ela nunca foi uma rede, como se fala. A TV Brasil é carregada obrigatoriamente por todos os canais por assinatura. A TV Brasil também é exibida pelas bandas C, que alcança 50 milhões de brasileiros que vêem televisão por parabólicas. Também entramos na programação das 24 emissoras educativas e universitárias que são nossas parceiras na Rede Pública de Televisão. Para 2009, estamos solicitando 39 canais de retransmissão ao Ministério das Comunicações. Eu acredito que serão concedidos porque a lei nos assegura essa prioridade. São canais que nós vamos instalar em grandes e médias cidades. Analógicos, abertos. Não vamos cobrir capitais. Demos prioridade às cidades onde a implantação da TV digital ainda vai demorar. A seleção foi minuciosamente estudada, levando em consideração lugares onde a gente não tenha transmissão e a Rede Pública não chega.
Nessa sexta-feira, dia 28, no Palácio do Planalto, estaremos assinando um protocolo com o Senado, com a Câmara, com o STJ e com o Ministério da Educação. Todos esses poderes têm redes digitais a montar. Com isso, nós vamos compartilhar a infra-estrutura para fazer a rede digital no Brasil. Então, são cinco parceiras para rachar os custos. Isso reduz significativamente os custos de implantação da nossa rede digital.
Queria que as pessoas soubessem como as redes comerciais trabalharam para se transformarem em rede. Fazer rede não é assim não, é um longo processo. Para as TVs comerciais não é fácil. Muito menos para uma TV pública que tem só quatro canais próprios. Agora, no ano que vem, com as 39 retransmissoras, teremos uma realidade melhor. E vamos cobrar que as TVs por assinatura cumpram plenamente a lei, coisa que elas não fazem. Nem todas estão carregando o sinal da TV Brasil.
C-se – Um ponto que é muito criticado é a audiência. Como a emissora enxerga essa questão?
Tereza Cruvinel - A natureza da nossa programação é diferente. Você leva muito mais tempo para fidelizar o telespectador com uma programação como a nossa. O cara que gosta de cinema nacional, ele começa a freqüentar a Faixa de cinema. O infantil, por exemplo, é muito bem visto. Fidelizar cliente, com uma programação como a nossa, é muito difícil, mas nós temos absoluta convicção de que não vamos fazer concessões na qualidade da programação para ganhar audiência.
C-se - Você falou que nesse primeiro ano a EBC passou por algumas dificuldades. Você pode destacar algumas delas?
Tereza Cruvinel - Primeiro foi a própria lei, num ambiente de muita incompreensão do que fosse TV pública, que chegou a ser chamada de TV Lula, Lula News. Ignorâncias misturadas com má-fé. Alguns não sabiam, outros não queriam entender. Então, foi um período muito difícil. Outro foi o momento que precedeu a incorporação da Radiobrás, que só aconteceu em 12/06. Sem isso, nós não tínhamos um centavo próprio. Outro momento difícil foi a saída de Orlando Senna. Ele saiu porque apontou grandes dificuldades de gestão que realmente existiam. E o momento do caso Luiz Lobo, que foi julgado pelo Conselho Curador. O Conselho constatou que o nosso telejornalismo é tecnicamente correto e politicamente isento. E durante todo o ano a gente sofreu com a Anatel para colocar o canal de São Paulo no ar. Isso sem falar nos problemas burocráticos, como contratação, licitação, coisas assim. Mas as dificuldades maiores foram essas.
C-se - Por falar em licitação, como está a escolha da empresa que vai produzir a Revista África?
Tereza Cruvinel - Uma produtora recorreu porque não apresentou os documentos necessários na época certa e isso gerou um atraso. Nós ainda vamos fazer a Revista América Latina, mas vamos fazer a África primeiro. (continua...)